“Senhora presidente Dilma, é preciso agir imediatamente e aderir clara e prontamente ao partido da maioria, que são os trabalhadores e trabalhadoras, os aposentados, as donas de casa, enfim, o povo sofrido que a elegeu”
*Por Luiza Erundina - Publicado no Congresso em Foco 19/03/2015
As jornadas de junho de 2013 que levaram às ruas e praças do
país centenas de milhares de brasileiros e brasileiras apontaram, em faixas e
cartazes, demandas difusas que ecoaram nas palavras de ordem gritadas repetida
e estrondosamente para chegar aos ouvidos de quem pretendiam atingir.
Certamente todos se lembram dos refrões: “Você não me
representa”; “Queremos participar”; “Exigimos nossos direitos – transporte,
saúde e educação de qualidade”; “Não à corrupção, ética na política”.
Eram recados diretos e claros dirigidos aos Poderes da
República e a todas as nossas instituições políticas. Quem os escutou e como
reagiram a eles?
Sob o impacto do susto, o governo tratou de engendrar
algumas poucas e improvisadas medidas, anunciadas em rede de televisão num pronunciamento
da presidente Dilma Rousseff, na tentativa desesperada de dar uma resposta ao
clamor das ruas.
O Congresso Nacional, por sua vez, num furor legiferante
jamais visto, desengavetou projetos que dormiam, havia anos, nas gavetas do
Legislativo, e os colocou em tramitação em reação às críticas e cobranças
contundentes que vieram das ruas.
Quase dois anos já se foram e quase nada se efetivou das
medidas anunciadas e promessas feitas pelos representantes dos dois Poderes,
inclusive durante a campanha eleitoral de 2014.
Como estranhar, então, a explosão das manifestações de 15 de
março de 2015, gestadas no ambiente de frustração pelas expectativas não
atendidas, que levou uma multidão novamente às ruas, expressando indignação e
revolta pelo descaso como se sente tratada pelos poderes constituídos, que não
tiveram capacidade nem vontade política para encaminhar as ações que prometeram
no calor da peleja e no sobressalto do susto que tomaram?
Se esperavam que tudo voltaria ao normal e as ruas ficariam
vazias outra vez, se enganaram. As manifestações de 15 de março foram mais
fortes e com maior furor, expresso nos gritos de “Fora Dilma” e na
agressividade das palavras de ordem.
Independentemente do número de participantes – um milhão, ou
mais ou menos que isso – as manifestações foram, realmente, impressionantes e
não devem ser subestimadas.
Os protestos, embora se dizendo apartidários, tinham como
foco a presidente Dilma e seu partido — o PT —, as críticas eram ofensivas e
antidemocráticas, mas, nada disso, nem mesmo o empenho engajado dos meios de
comunicação em defendê-las, tira das manifestações sua legitimidade e seu
significado como exercício de liberdade de expressão.
O segundo governo Dilma se inicia em meio a dificuldades
incomuns na inauguração de um mandato presidencial, e seria um erro lamentável
creditá-las, exclusivamente, ao reacionarismo de amplos segmentos da sociedade
brasileira, tendo a elite à sua frente.
Isolados, a presidente e seu partido distanciaram-se do
contato com o povo e adotaram a tese conservadora e equivocada de que é preciso
deter o crescimento econômico, num momento em que o país não cresce. Além
disso, impuseram arrocho e sacrifício aos assalariados, mantendo intocados os
privilégios dos rentistas.
Essa opção cobra seu preço, erodindo a base de apoio da
presidente na sociedade.
O cenário se completa com um ministério inexpressivo,
integrado por remanescentes de velhas oligarquias e prepostos do capital
financeiro, sob a justificativa de uma pretensa governabilidade, e com a
deplorável formação de um cartel político-empresarial no seio da maior empresa
do país e uma das maiores do mundo no setor de petróleo.
O preocupante é que, nesse ambiente, crescem as
manifestações de desapreço à democracia, inclusive pelos que gritam “palavras
de ordem” nas ruas.
Parte da oposição conservadora se mantém mobilizada como se
estivesse no “terceiro turno” das eleições. Há até quem ouse pensar em golpe.
Atentemos, todos, para o fato de que o Estado democrático de
direito é uma inestimável conquista do povo brasileiro; é um bem supremo que
devemos defender e preservar a todo custo. Graças a ele é que, hoje, somos
livres para nos manifestar e, até mesmo, nos insurgirmos contra a própria
democracia.
Assim, criticar, cobrar, protestar pacificamente é um
direito de todos. De outro lado, é dever da presidente estar atenta às vozes
que vêm das ruas e abrir-se ao diálogo franco e construtivo com quem se
dispuser a ajudar a edificar o país em outras bases e fundamentos éticos,
capazes de sustentar uma nação justa e soberana onde todos e todas tenham
assegurados o pleno exercício de sua cidadania.
Senhora presidente Dilma, é preciso agir imediatamente e
aderir clara e prontamente ao partido da maioria, que são os trabalhadores e
trabalhadoras, os aposentados, as donas de casa…, enfim, o povo sofrido que a
elegeu e que espera que suas conquistas sejam preservadas e seus direitos
assegurados.
É preciso ter lado na vida e na política. E o seu,
presidente, é o mesmo que a senhora escolheu, quando, ainda muito jovem, se
juntou a tantos outros brasileiros e brasileiras para lutar, brava e
generosamente, contra a ditadura civil-militar e pelas liberdades democráticas
no Brasil.
Conte conosco, presidente Dilma, nessa difícil travessia e
no cumprimento da inadiável tarefa de reconquistar a confiança e o apoio
popular para governar o nosso país para todos!
* Luiza Erundina (PSB-SP), ex-prefeita de São Paulo, é
deputada federal e 3ª suplente da Mesa Diretora da Câmara.
O mar da hipocrisia humana tá arrastando nossa débil democracia para o afogamento.
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