*Publicado na Revista FELC n° 10 / Ano X / Jan 2016
Neste ano que termina o povo de São
Paulo me prestou duas homenagens que se revestem de especial significado,
transcendendo meus méritos pessoais, e que divido com meus conterrâneos de
Uiraúna, terra querida onde minhas raízes estão plantadas.
A primeira homenagem foi a medalha
“São Paulo Apóstolo”, sendo meu nome escolhido em votação promovida pela
Arquidiocese de São Paulo e que foi entregue a mim e a outros ilustres
homenageados por sua Eminência Reverendíssima Cardeal Odilo Pedro Scherer em
ato solene realizado no dia 25 de agosto de 2015.
A segunda, foi o Prêmio de Direitos Humanos
“Dom Paulo Evaristo Arns”, concedido pela municipalidade de São Paulo e que
tive a honra de receber pelas mãos de Sua Excelência o Prefeito Fernando Haddad
no dia 10 de dezembro deste ano, data em que se comemora o Dia Mundial dos
Direitos Humanos, em solenidade que contou com as presenças de autoridades e
muitos amigos, conferindo, assim, mais prestígio e significado ao generoso
gesto dos paulistanos para comigo.
Ambas as homenagens, carregadas de
simbolismo, foram oportunidades para expressar minha gratidão a São Paulo pelo
muito que a cidade tem feito por mim, por meus irmãos nordestinos, pelos
migrantes do mundo inteiro, que para ela acorrem em busca de sobrevivência e
trabalho, de realização pessoal e profissional... enfim, em busca de
felicidade.
São Paulo me acolheu quarenta e
cinco anos atrás, com a magnanimidade que lhe é peculiar, mas que, ao mesmo
tempo, lança desafios de quem tem a vocação de ir na frente para construir, no
presente, seu próprio futuro. São Paulo faz isso com arrojo e inspirada no seu
lema: “Non ducor, duco.” Idêntica ousadia ela exige de cada um dos cidadãos e
cidadãs que nela nasceram ou que para lá migraram.
Desde que lá cheguei, me dei conta
de que teria que ser forte se quisesse sobreviver aos embates que se travam
quotidianamente dentro e fora de suas fronteiras. Também entendi que essa era a
contrapartida que eu teria que dar pelas oportunidades que a cidade me propiciou.
Lembro-me bem quando, no dia 28 de
janeiro de 1971, desembarquei na cidade, há quase quarenta e cinco anos. É como
se fosse hoje.
A sensação mais forte que
experimentei ao pisar seu chão e ao percorrer suas ruas e avenidas, era de
alguém muito estranha e terrivelmente só. Ao mesmo tempo me sentia invadida
pelas mensagens sem conta dos anúncios luminosos que se chocavam com as imagens
e sons que trazia na memória misturados à saudade sem fim dos que deixara lá
longe.
Até lembranças da infância
afloravam aos borbotões me atordoando e me trazendo de volta um passado
distante como naquela noite em que, ainda muito criança, vi luz elétrica pela
primeira vez, quando a professora nos levou para conhecermos a vizinha cidade
de Souza.
Levei um tempo para me adaptar ao
ritmo do dinamismo da gigantesca cidade. Hoje não sei viver noutro lugar.
Diferentemente de quando cheguei a São Paulo, é lá que me sinto em casa e para
onde tenho pressa de voltar.
São Paulo mudou muito nessas
últimas quatro décadas. Já está longe o tempo em que o frio intenso dos seus
dias de garoa fazia o tormento dos que lá chegavam e eram obrigados a se
amontoar nas favelas e cortiços que, infelizmente, ainda hoje são a parte
triste e feia do cenário da cidade.
Contrastando com isso, crescem
parques e áreas verdes, revelando o despertar da consciência ecológica da sua
gente e a descoberta da natureza como um dom de Deus à humanidade.
Sabe outra coisa que em São Paulo
me encanta? É a variedade de raças, de culturas, de tipos humanos que formam
seu povo, o povo paulistano, cuja ousadia levou a que vinte sete anos atrás elegesse
uma paraibana de Uiraúna, filha de um seleiro e uma dona de casa, a primeira
prefeita de São Paulo.
Um novo capítulo dessa história
começou a ser escrito a partir de 1º de janeiro de 1989, quando recebi das mãos
soberanas do povo paulistano o mandato para conduzir os destinos de sua cidade.
A opção por uma mulher, uma nordestina, uma filha de artesão, marcou o início
de um novo tempo na cidade de São Paulo, pelo próprio povo que se tornou o
principal protagonista do primeiro governo Democrático Popular da capital
paulista.
Ao concluir, registro a emoção que vivi
ao receber um Prêmio que leva o nome do amado Pastor e iluminado Profeta da
Esperança e dos Direitos Humanos – Dom Paulo Evaristo Arns – a quem muito devo
pela sua confiança e decisivo apoio nos momentos de extrema dificuldade que
enfrentamos durante o nosso governo.
Luiza Erundina de Sousa
Deputada Federal – PSB/SP
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